Em 78 povos, o Brasil contabiliza 1.809 indígenas infectados pela Covid-19, doença causada pelo Sars CoV-2. De acordo com a Articulação de Povos Indígenas do Brasil (Apib), são 178 mortes até este domingo (31).
Os números da organização civil são maiores do que os apresentados pela Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai). Os dados do Ministério da Saúde apontam 51 mortos e foram atualizados pela última vez no sábado (30), às 17h. São 1.312 casos confirmados pelo governo federal entre os povos indígenas do Brasil.
De acordo com Sonia Guajajara, líder indígena e coordenadora da Apib, o governo brasileiro não está "trazendo a gravidade que é esta pandemia". Com relação aos povos, "há um racismo institucional impregnado, que é estrutural, e que se reproduz ao longo dos tempos". Ela se refere ao fato de o governo federal contabilizar os casos e mortes apenas de indígenas que estão nas aldeias e territórios.
"A Sesai faz uma seleção de quem eles acham que é indígena e quem não é. Então, eles não registram indígenas que estão em contexto urbano. A própria estrutura da Sesai, sem atendimento próximo a algumas aldeias, faz os indígenas irem para os municípios. Lá, eles entram na contagem normal do município, sem serem considerados indígenas com Covid", disse Guajajara, em entrevista ao G1.
De acordo com a Sesai, as informações são obtidas junto a cada um dos trinta e quatro Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEI) e são validadas pelo Departamento de Atenção à Saúde Indígena (DASI). O Censo IBGE 2010, dado oficial mais recente no país, aponta a existência de 305 povos indígenas no total, que somam 896.917 pessoas. Destes, 324.834 vivem em cidades e 572.083 em áreas rurais, o que corresponde a aproximadamente a 0,47% da população.
A maioria da população indígena está distribuída por milhares de aldeias, localizadas em 723 territórios em todas as regiões do Brasil.
Aumento dos casos e barreiras de proteção
Desde o dia 8 de maio, as mortes contabilizadas pela Apib quadruplicaram - na data, eram 38. As divulgadas pela governo triplicaram entre os povos indígenas: eram 14. De acordo com Guajajara, o povo Kokama, no Amazonas, é o mais afetado até esta segunda-feira (1º), com 54 mortes pela Covid-19.
"É um retrato real do que esse vírus pode representar para os povos indígenas: o extermínio total de povos. Entrando no território é muito fácil a propagação porque a estrutura das casas ajuda, todo mundo mora e dorme junto. Isso facilita muito a propagação do vírus. O povo Kokama mostra quanto que esse vírus é letal dentro da comunidade", disse.
Como forma de proteção, o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) informa que os próprios povos estão organizando barreiras sanitárias ao redor de suas aldeias. No início de maio, o povo Tremembé da Barra do Mundaú, no Ceará, decidiu impedir a entrada de visitantes no território, localizado no município de Itapipoca, interior do estado.
"O Povo Tremembé da Barra do Mundaú, preocupado em proteger o território desta pandemia, decide implantar uma barreira sanitária com monitoramento 24 horas. Pedimos, com muita humildade, que respeitem as orientações da OMS (Organização Mundial da Saúde)", escreveram os indígenas, em nota.
No sul da Bahia, no último domingo, foi confirmada a primeira morte por Covid-19. O homem da aldeia Tupinambá de Olivença, na cidade de Ilhéus, morreu em 17 de maio. O paciente era um idoso de cerca de 80 anos, sem a idade detalhada. Treze pessoas do mesmo território se contaminaram após contato. De acordo com o Movimento Unido dos Povos Indígenas da Bahia (Mupoíba) e da Associação Nacional Indigenista (Anai), cerca de 21 indígenas da região estão infectados pelo Sars CoV-2.
Além disso, casos que foram divulgados há mais de 1 mês não foram contabilizados pela Sesai. Em 26 de abril, o G1 noticiou a primeira morte de um indígena no Amapá. Uma paciente de 36 anos, que vivia numa aldeia em Oiapoque, foi o primeiro caso confirmado de Covid-19 no estado. A morte da indígena, que desde março também tratava de um câncer em Macapá, foi confirmada pelo governo do estado.
No dia 25 de maio, o líder indígena Gumercindo da Silva Karitiana, de 66 anos, do povo Karitiana, morreu em Rondônia. Essa foi a primeira morte entre os povos do estado.
O Cimi afirmou na ocasião que outros dois indígenas estão internados em estado crítico em Rondônia.